A pandemia e o WhatsApp tornaram minha vida um inferno

Depois de muito tempo sem escrever um texto longo eu voltei, ou pelo menos eu acho que voltei, a fazer um blog. E ele tem jeito de blog, texto introdutório de blog que avisa que já faz um tempo que o autor não escreve. Ele também tem o futuro promissor de um blog: que poder ser não dar em nada além de um gasto desnecessário de hospedagem e de um tempo que antes era livre.

Mas eu vou escrever numa aposta que eu torço pra que se confirme de que escrever assim me faz bem, me faz reduzir a ansiedade e vai me distanciar do ritmo frenético das postagens do Twitter, dos updates incessantes dos stories nos aplicativos e do eterno tilintar de notificações do WhatsApp e do celular.

A verdade é que eu já desativei as notificações da maioria dos apps do smartphone, especialmente os de mensagens. O Facebook eu já nem tenho instalado no celular porque eu uso, numa frequência cada vez menor, a interface do navegador mesmo. Mas a sensação que me dá é a de que as notificações já nem são necessárias. Não porque eu tenha me desapegado completamente de ser avisado das novidades mais desnecessárias de última hora. Mas porque eu, mesmo sem receber um aviso, ou ver uma bolinha vermelha com o número de novas mensagens, me dou ao trabalho quase involuntário de entrar pra ver o que tem. Eu sou o próprio mecanismo push (ironia esse nome, não?). E pra minha decepção: quase sempre tem uma novidade que não fará diferença nenhuma na minha ou na sua vida.

A maioria dessas novidades são de grupos de amigos, trabalho e família. Os de trabalho eu me senti no direito de me retirar, dando inclusive a justificativa de que o meu WhatsApp era apenas pra falar com minha família, meus amigos e meus contatinhos. Eu saí logo no início da pandemia pois, pra quem não sabe, eu sou professor de uma escola pública. E, em março de 2020, num estalar de dedos eu já estava incluído em grupos de trabalho para os quais eu nunca autorizei minha adição. E do dia pra noite esses grupos viraram uma metralhadora de normativas, legislações, solicitações e mais uma pancada de coisas que eu não consegui ler nem atender. O triste é saber que outras pessoas que não são funcionárias públicas nem podem sair de um grupo sem sofrer algum tipo de sanção ou retaliação.

O resultado foi que eu estou sem ser comunicado de várias coisas que acontecem na escola e eu acho que é até bom. Se for algo urgente e de extrema necessidade o número de telefone está com a escola para ligações. Eu não sofri retaliação direta, mas de certa forma estou excluído de vários acontecimentos que a direção e a coordenação só comunicam via WhatsApp, mesmo que eu, de modo insistente e repetido tenha pedido pra ser avisado por e-mail. Como não surtiu efeito eu desisti de participar desses detalhes dispensáveis da administração escolar. Creio que fica até mais fácil focar em trabalho de verdade que é ensinar e aprender Língua Portuguesa com meus estudantes.

Mas o ponto é: eu criei uma barreira em nome da minha saúde mental e física. E preciso fazer uma vírgula: eu gosto muito de tecnologia, eu aprecio as possibilidades que a internet e um smartphone podem trazer. Mas de uns tempos pra cá eu tenho me sentido em gestos robóticos, repetitivos de checar stories e caixas de mensagens em diferentes aplicativos sem às vezes nem ler o que eu estou lendo. Uma leitura automática, sem sentido nenhum além do fonético. Parênteses fechados: só o fato de eu criar essa barreira de dificuldade já deu uma preguiça nas coordenadoras e diretoras de me contatarem à torto e à direito, mesmo nos horários em que eu não estou trabalhando. E pra dizer a verdade, foi a melhor coisa que eu pude fazer pelo meu bem-estar em 2020.

E falando de bem-estar eu preciso dizer que não é só o grupo de trabalho que virou um inferno na minha vida. Com o passar da pandemia o grupo de amigos, pessoas que eu amo e admiro, se tornou um peso enorme. Um ano de tela, de grupo, de updates sem pausas fizeram o WhatsApp virar um fator de ansiedade. Às vezes eu fico chateado quando mando alguma coisa e não respondem, ou ignoram e vão pra outro assunto. O que é normal. Eu mesmo ignoro várias coisas no grupo dos meus amigos mais próximos. Mas pra gente os atos dos outros têm um peso maior que o nosso. Certamente eles sentem o mesmo que eu em proporções não muito diferentes. E parece tão difícil achar um equilíbrio pra essas coisas e esses sentimentos. Parece que nem meu terapeuta é capaz de me dar uma luz do que eu quero ou posso fazer com toda essa pororoca de emoção ativadas por comandos digitais.

Bom, eu fiz um teste outro dia num site chamado 16 personalities que utiliza a tipologia Myers-Briggs. O site faz algumas perguntas e dura uns 15 minutos. Ele é organizado com respostas que vão de um espectro concordo, neutro ao discordo. O teste, como todo teste, é contestado – inclusive pelo meu terapeuta – em sua eficácia de medir personalidades. Até porque cada serzinho desse mundo é tão único pra juntar num grande balaio de semelhanças, né? Mas enfim, tem gente que acredita em Deus, em constelações que guiam o destino individual, em energias positivas que afastam o Corona vírus, ou que estamos vivendo em uma simulação de computador. Então eu acho que dá pra acreditar um pouquinho no tal teste MBTI. Eu já fiz várias vezes, e cada vez esse teste deu um resultado diferente. O que pode indicar que eu mudei, me encontrei ou que o teste não funciona mesmo pra nada.

De qualquer jeito o meu resultado foi que eu sou um INTJ Turbulento à semelhança de figuras amáveis e éticas do naipe de Elon Musk, Nietzsche, Vladimir Putin, Colin Powell, Stalin e provavelmente a ex BBB Viih Tube. O ponto é que, mesmo dando errado, esse teste foi revelador de várias características minhas que a constante interação online hiperboliza ou oculta completamente. Uma delas é a introversão, que muita gente vê como uma falha de personalidade. Mas poxa, é tão bom ficar na minha, né? Eu ficava o dia inteiro em casa quando era criança e zerava um livro em poucas horas e tava tudo bem, sabe. Hoje eu não consigo ler quase nada, mais próximo do nada do que do quase.

O comentário sobre esse teste não é tão aleatório. É que hoje eu decidi fazer uma jornada de desintoxicação do WhatsApp. Vou testar como meu humor vai ficar nos próximos dias. Eu digo desintoxicação porque que eu desconfio que minha dependência desses apps beira a relação que algumas drogas podem trazer. Se vai fazer alguma diferença essa distância de cinco dias que eu vou fazer do zap zap? Olha… Eu espero, primeiramente, conseguir ficar longe e, depois, sair dessa onda de estresse que eu estou nesse momento. E talvez eu seja um INTJ mesmo e o teste esteja certo porque eu baixei uns 3 outros apps pra monitorar em forma de gráfico minhas variações de humor nessa semana. Desejem-me sorte. Em breve trago, com linhas ou barras, os resultados dessa jornada de isolamento voluntário.